Gente do Ramo

As leituras obrigatórias para vestibulandos que vão concorrer a uma vaga na Universidade de São Paulo (USP) e na Universidade Estadual de Campimas (Unicamp) em 2012 segue igual à do último vestibular. São nove obras de diferentes períodos da literatura brasileira e portuguesa: Auto da Barca do Inferno, de Gil Vicente; Memórias de um Sargento de Milícias, de Manuel Antônio de Almeida; Iracema, de José de Alencar; Dom Casmurro, de Machado de Assis; O Cortiço, de Aluísio Azevedo; A Cidade e as Serras, de Eça de Queirós; Vidas Secas, de Graciliano Ramos; Capitães da Areia, de Jorge Amado; e a Antologia Poética (com base na 2ª ed. aumentada) de Vinícius de Moraes.
Segundo o manual do candidato do último vestibular, o vestibulando deve demonstrar "conhecimento das obras representativas dos diferentes períodos das literaturas brasileira e portuguesa. O conhecimento desse repertório implica a capacidade de analisar e interpretar os textos, reconhecendo seus diferentes gêneros e modalidades, bem como seus elementos de composição, tanto aqueles próprios da prosa quanto os da poesia. Implica também a capacidade de relacionar os textos com o conjunto da obra em que se insere, com outros textos e com seus contexto histórico e cultural."

“Iracema”, o romance indianista de José de Alencar
Livro mistura elementos indígenas mitológicos com históricos em busca da formação de uma identidade nacional.

A história da índia Iracema que se apaixona por um europeu, Martim Soares Moreno, personagem histórico real, mistura aspectos mitológicos da cultura indígena com a colonização do Brasil. Publicado em 1865, “Iracema”, do escritor cearense José de Alencar, é um romance escrito em prosa poética, o que dá a obra uma dimensão mítica, de lenda, mas sempre apoiada em um argumento histórico.
“Para alguns críticos o primeiro brasileiro aparece na figura de Moacir – filho da união da índia Iracema com o elemento colonizador, Martim. É a formação da identidade nacional simbolizada nesse encontro”, avalia Marcelo Almeida Peloggio, professor e Coordenador do Grupo de Estudos José de Alencar, na Universidade Federal do Ceará.
Autor de teses de mestrado e doutorado sobre o Alencar, Peloggio destaca a importância da compreensão da simbologia utilizada pelo autor. Mito e história se complementam na obra. “Iracema vai sendo esmaecida pelo fator histórico, que é a chegada dos portugueses e a ocupação da terra. É uma representação do que houve com a população indígena, que foi dizimada ou sofreu aculturação”, afirma o professor.
Durante a leitura, é importante que os estudantes estejam atentos a alguns pontos. Peloggio destaca a riqueza poética, a valorização da natureza, a celebração das características brasileiras, próprias do romantismo. “É importante perceber a cor local que Alencar imprime na obra ao valorizar os elementos. Pássaros, árvores, animais, a linguagem e o cenário do Ceará do século 17.”
Os estudantes também devem notar a harmonia que havia entre Iracema, sua tribo e sua terra, e como essa relação pacífica é quebrada a partir do momento em que o elemento histórico (a colonização portuguesa) avança e domina. “Quando Iracema se entrega a Martim, ela rompe os laços sagrados com a sua tribo e sai da esfera mítica para entrar na esfera da história. Alencar mostra a dura realidade do povo indígena e do combate civilizatório que se travou naquele momento.”
Identidade nacional
A heroína é idealizada, representante da natureza brasileira e símbolo da perfeição. Martim é o colonizador: desperta curiosidade e fascínio, traz o amor e a desgraça para Iracema (representa a destruição para as tribos indígenas). A narração em terceira pessoa, deixa, por vezes, entrever a primeira pessoa, um eu (narrador) saudoso de sua terra natal. “É uma obra que busca criar uma identidade nacional, um símbolo da nacionalidade brasileira que era uma necessidade da sociedade naquele tempo”, resume Peloggio.